Festa da Irmandade de Santa Efigênia mescla fé católica e tradição afro com missa e congada de quase 300 anos em Niquelândia
Capela construída em 1790, em devoção à uma das únicas ‘santas pretas’ da Igreja Católica, reuniu fiéis no feriado religioso celebrado hoje na cidade do Norte do Estado: congos utilizam roupas brancas com lenço branco na cabeça, preso por uma faixa decorada com medalhas de santos, por influência da cultura africana
Católicos lotaram a missa campal realizada na manhã do feriado municipal da quinta-feira/25 em Niquelândia, por ocasião da tradicionalíssima Festa da Irmandade de Santa Efigênia. No âmbito da Diocese de Uruaçu, as atividades litúrgicas da capela estão subordinadas à Paróquia e Santuário São José, hoje sob a responsabilidade do frei Pedro Rodrigues da Silva, atual pároco da “Igreja Matriz” da cidade.
CRONOLOGIA – O festejo fora iniciado no último dia 24 de junho, com a tradicional a Capina do Largo de Santa Efigênia diante da “igreja dos pretos”, nome inicialmente dado ao centro religioso construído em 1790 para ser frequentado por negros que, enquanto escravos, eram segregados do convívio com a população branca.
O local sagrado encontra-se relativamente bem preservado, após ter passado por intervenções nos últimos anos, com o objetivo de garantir solidez à sua estrutura.
CONGADAS – Presidida atualmente por Almir Pedroso e Silva a congada da Irmandade de Santa Efigênia fez várias apresentações durante a novena (desde o sábado/16) fortalecendo laços culturais e religiosos em Niquelândia.
Os congos – como são conhecidos – resgataram assim uma tradição de 289 anos com suas roupas brancas em homenagem à santa com um lenço branco na cabeça, preso com uma faixa decorada com medalhas de santos, dada a influência da cultura africana.
Para o próximo ano, a Associação Comunitária de Santa Efigênia – (entidade sem fins lucrativos criada para a gestão de recursos destinados à manutenção do festejo) iniciará a contagem regressiva ao seu 5º Jubileu de Ouro a ser comemorado em 2035, juntamente com o 300º aniversário de Niquelândia.A mais esperada das apresentações dos congos entretanto, ocorreu justamente no final da manhã deste feriado dedicado à santa na cidade do Norte do Estado, por volta das 12 horas.
Mais cedo, no entanto – por volta das 8 horas – houve o tradicional café da manhã dedicado aos congos numa residência simples do Bairro Soares.
Nesse local, Lenileia José Toledo – a popular Leninha – é responsável há oito anos pela manutenção da tradição da família Toledo, herdada de seu pai José Bonifácio Toledo, o popular Zé Toledo.
Neto e bisneto de congos, Zé Toledo fez parte da Irmandade de Santa Efigenia, mas preferiu deixar seu lugar cativo à participação “para os mais novos”, segundo ela própria afirmou. Zé Toledo faleceu há cinco anos.
Na mesa repleta de ‘quitandas’ – como bolos e biscoitos – foram servidos também café e leite fresquinhos preparados com carinho – além de refrigerantes – para celebrar o início do feriado que celebra a fé e a cultura afro-brasileira no município.
Segundo ela, o café tal como é realizado hoje não existia na programação original da festa, pois era servido sempre no dia 26 de cada ano, ofertado oficialmente pela Irmandade de Santa Efigênia.
Foi quando Zé Toledo teve a ideia do café no dia 25, iniciado com apenas duas mesas, depois com quatro. Os refrigerantes vieram posteriormente.
Ao contrário do que alguém poderia imaginar, a morte do pai não representou desestímulo algum para Leninha para o singelo momento de ofertar o alimento aos congos, antes da missa.
“Enquanto eu e meus irmãos estivermos vivos – além da minha mãe, que também está conosco aqui, juntamente com as minhas cunhadas – bem como também meus vizinhos, que sempre estão nos ajudando, aqui na minha casa sempre terá esse café da manhã no dia 25”, afirmou Leninha, em rápida entrevista ao Excelência Notícias.
QUEM FOI SANTA EFIGÊNIA? – Santa Efigênia, entre os católicos, é considerada a “advogada contra incêndios e protetora da moradia”.Por isso, seus devotos também fazem orações para pedir a graça de conseguir comprar a casa própria. Nos braços, a imagem de Santa Efigênia carrega justamente um imóvel.
Uma das poucas santas negras (a exemplo de São Benedito) da Igreja Católica, Efigênia (ou Ifigênia) virou santa por seu histórico de lutas, tendo sido a responsável pela disseminação do catolicismo na Etiópia, um dos países mais pobres da África.
“Santa Efigenia, com certeza, não tinha a dimensão de tudo o que precisaria passar ao longo de sua vida, assim como os apóstolos e nós, que também não temos. Mas sempre há o momento de lançar a semente, o que significa dizer que vocês (os fiéis) terão de batalhar espiritualmente em suas vidas como cristãos. Vocês precisarão fazer um processo muito diferente do qual vocês foram educados ao longo da sua vida, em prol da evangelização”, pregou, em sua homilia, o frei Rafael Maria Dias Lima, atual vigário do Santuário São José, que celebrou a missa no período matutino.
Outros momentos importantes da Festa da Irmandade de Santa Efigênia, ao longo de toda a sua história, são o levantamento do mastro da santa (sempre no dia 29 de junho); o cortejo; a procissão; as missas; e os almoços de confraternização oferecidos pela imperatriz e o imperador de Nossa Senhora do Carmo.
Neste ano, o principal deles foi oferecido numa casa do Bairro Evereste neste feriado municipal. Dez festeiros (cinco de Santa Efigênia e cinco de Nossa Senhora do Carmo) sempre trabalharam de maneira árdua na organização do evento ao longo dos anos na cidade do Norte do Estado.
Na manhã de hoje, o Poder Executivo da cidade foi representado pelas secretárias municipais Nubiana de Fátima Nolasco (Governo) e Márcia Alves Vila Nova da Silva (Cultura).