Em entrevista exclusiva, padre Aldemir Franzin revela arrecadação anual da Romaria do Muquém, que começa segunda
Reitor do Santuário de Nossa Senhora da Abadia detalhou destinação do dinheiro auferido pela Igreja Católica durante os 10 dias do festejo, que deve arregimentar 400 mil pessoas em sua 271ª edição: fé e devoção marcam maior Romaria Mariana do Centro-Oeste
Reitor do Santuário de Nossa Senhora da Abadia do Muquém em Niquelândia, no Norte do Estado, padre Aldemir Franzin concedeu uma longa entrevista exclusiva ao Portal Excelência Notícias no meio desta semana. Na visita que fez à redação sob comando do jornalista e editor-geral Euclides Oliveira, padre Aldemir discorreu sobre todos os detalhes da organização da 271ª edição da romaria, que é o evento mariano mais antigo da Igreja Católica na Região Centro-Oeste. Como se sabe, a Romaria do Muquém terá seu início na próxima segunda-feira (5) com a saída do andor com a imagem da santa da paróquia de mesmo nome, onde será celebrada missa solene na região central do município. O religioso falou de diversos aspectos da romaria, desde a estimativa da participação de 400 mil pessoas até o dia 15, data em que é comemorado o Dia de Nossa Senhora com missa solene na presença do governador Ronaldo Caiado (DEM) e demais autoridades; e concordou em dar detalhes sobre o valor e a destinação do dinheiro efetivamente arrecadado com a romaria, algo sempre muito questionado nas redes sociais. Confira, abaixo, a íntegra da entrevista que fizemos com o padre Aldemir Fraznin:
Portal Excelência Notícias – Como estão os preparativos finais à Romaria do Muquém neste ano?
Padre Aldemir Franzin – Então, o coração bate mais forte pois falta pouco tempo para nós iniciarmos os 271 anos de devoção à Nossa Senhora da Abadia, na região do Muquém. Os preparativos são organizados ao longo do ano, no que diz respeito à hospedagem dos romeiros, nas áreas de acampamento, porque não existe hotel no Muquém e nem casas de alvenaria ao redor do Santuário. Faz parte, da cultura do romeiro, montar tendas – uma espécie de camping – nas proximidades do templo. A área comercial, que possui 55 mil metros quadrados, também é toda preparada por nós onde existe um sistema de comércio em funcionamento durante esses 10 dias, montados por pessoas de Niquelândia, de Brasília, de Goiânia, e de várias partes do Brasil, para abastecer a nossa Romaria. O outro espaço, também bastante significativo, é a área interna do Santuário. Então, a organização verifica o funcionamento das partes elétricas e hidráulicas do Santuário; a escala dos padres e dos bispos que irão celebrar as missas. Embora a Diocese de Uruaçu não tenha o seu bispo nesse momento (Dom Messias dos Reis Silveira assumiu recentemente a Diocese de Teófilo Otoni-MG) de forma que o celebrante no dia 15 será o padre Francisco Agamenilton Damascena, nosso Administrador Diocesano – teremos quatro bispos de outras dioceses celebrando no Muquém, nos dando esse suporte: dom Adair (José Guimarães), bispo de Formosa; Dom José (da Silva) Chvaes, bispo emérito de Uruaçu, que ainda está firme e forte; Dom Joel Portella Amado (bispo auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro e atual e secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil/CNBB); e Dom José Francisco Rodrigues do Rêgo (que era pároco da Catedral Nossa Senhora de Santana em Uruaçu, sendo nomeado recentemente pelo Vaticano para ser o novo bispo da Diocese de Ipameri, na região de Catalão). Teremos, também, os padres da Diocese de Uruaçu; padres de outras dioceses; e leigos, nos ajudando em esquema de ‘mutirão’ na Romaria.
Excelência Notícias – A cada ano, notamos novidades e/ou obras na área interna do Santuário do Muquém, objetivando segurança e melhores condições aos devotos e demais visitantes. Para este ano, o que foi feito?
Padre Aldemir – Fizemos a construção de duas salas, climatizadas, num total de 120 metros quadrados, sendo uma para a Sacristia no sentido de melhorarmos a organização dos objetos sacros e paramentos (vestes dos sacerdotes) necessários às celebrações. Uma outra sala foi planejada para atender ao sistema da WebTV Maria, às transmissões das missas. Na área comercial, foi colocado um novo sistema de tela sombrite (lonas com algum grau de transparência, bastante comuns no estacionamento de supermercados nos grandes centros) nas ruas onde os romeiros trafegam, de forma que não haverá mais como as barracas amarrarem lonas (nos corredores das ruas internas). Com essa estrutura, que diminui a temperatura, os romeiros poderão caminhar naquele espaço onde ficam as tendas de comércio.
Excelência Notícias – Os sistemas de água, da Saneago; e de energia elétrica, da Enel, receberam algum tipo de aperfeiçoamento para atender melhor aos romeiros de Nossa Senhora da Abadia no Muquém? A Prefeitura de Niquelândia também está auxiliando nessa retaguarda? Muitos fiéis já iniciaram a montagem dos seus acampamentos.
Padre Aldemir – Oficialmente para nós, da organização, a Romaria do Muquém começa nesta segunda-feira, dia 5. Porém, para o devoto, a romaria começa exatamente quando ele pega o carro com sua família e entra na estrada, rumo ao Santuário. A Enel, como de costume, iniciou a ligação das redes de energia nesta quinta-feira, dia 1º; a Saneago já montou toda sua estrutura; e a Prefeitura de Niquelândia também vai disponibilizar caminhões de lixo para fazer a coleta dos resíduos na romaria; e reforçar o atendimento na Unidade Básica de Saúde (UBS) do Povoado. A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros também estarão presentes, com todo seu aparato. Fazemos esse trabalho com muita antecedência. A partir do dia 1º, o Santuário do Muquém fica aberto 24 horas por dia, fechando somente no dia 16 à noite, para melhor atendimento das peregrinações; de comitivas; vindas de várias rotas do Estado de Goiás. Atualmente, 92% visitam o Muquém por meio de veículos motorizados; mas também com seus animais, bem como ciclistas; e assim por diante.
Excelência Notícias – Os sistemas de telefonia móvel da Oi e da Tim – um antigo desejo de todos que frequentam o Muquém – já estão funcionando? Talvez seja a grande novidade para este ano, não é mesmo?
Padre Aldemir – Então, nós fomos à Brasília, no Congresso Nacional, onde o senador Vanderlan Cardoso (PR) nos abriu as portas de seu gabinete no Senado, oportunidade em que entregamos ofícios solicitando essa demanda da telefonia celular; e ele (Vanderlan) encaminhou esse procedimento junto às operadoras. Uma grande dificuldade da nossa Romaria do Muquém, todos sabem, sempre foi a comunicação. Um local onde o número de visitantes chega a 400 mil pessoas em 10 dias, sem poder se comunicar com o mundo? Quer dizer, ao passo que estamos na era da modernização e da tecnologia, a Romaria do Muquém ainda encontrava esse grande desafio. Então, nos fomos atendidos com a presença de unidades móveis da Oi na área interna do Santuário e também no Povoado do Muquém, disponibilizando o sinal num raio de três a quatro quilômetros da igreja. Na área comercial também estarão funcionando esses equipamentos, bem como de frente à praça principal do Santuário. Já a operadora Tim trouxe algumas carretas/carretinhas com suas torres móveis para configuração via satélite de seus sistemas operacionais. Eu, inclusive, já falei usando o celular da cozinha da minha casa no Muquém. Esse era um grande sonho dos romeiros. Inclusive, na missa do dia 15, às 9 horas – quando teremos a transmissão da Missa da Padroeira, pela Rede Vida, ao vivo para todo o Brasil – vou entregar três ofícios para os diretores das operadoras Oi e Tim para que deixem esse sistema de Telefonia Rural e Internet no Santuário, em caráter permanente. Esse é o primeiro pedido que faremos.
Excelência Notícias – Haverá algum pedido especial para o Governo de Goiás, que neste ano estará representando no dia 15 pelo atual governador Ronaldo Caiado (DEM)? Dá para nos adiantar alguma coisa? Ou é segredo para o dia 15?
Padre Aldemir – É segredo para o dia 15 (risos). Mas, brincadeira à parte, também pediremos ao governador Ronaldo Caiado para que o dia 15 de agosto seja decretado feriado estadual em Goiás, em documento referendado pelos senadores e demais parlamentares estaduais e federais. Este ano, por exemplo, em que o dia 15 cai numa quinta-feira, que é feriado municipal apenas aqui em Niquelândia, o servidor público municipal, estadual ou federal de outras cidades não tem como vir até o Muquém para prestigiar a nossa Romaria, porque é um dia de trabalho comum em que as pessoas precisam bater o cartão de ponto, já que possuem cargos, funções e responsabilidades. Esse será nosso segundo pedido, igualmente importante.
Excelência Notícias – Neste ano, a 271ª Romaria do Muquém enfoca o tema “Com Maria, batizados e enviados: a Igreja de Cristo em missão no mundo”. Como se deu essa escolha?
Padre Aldemir – Atendendo a um pedido do Papa Francisco – que lançará agora em outubro, um Mês Missionário Extraordinário – o tema “Batizados e enviados: a Igreja de Cristo em missão no mundo”, nosso Santo Pontífice está exortando que a Igreja faça esse mutirão de evangelização, de sair das igrejas, de visitar as pessoas; acolher as pessoas; rezar por elas; ajudar naquilo que for possível, ir ao encontros dos fracos e oprimidos, tal como o trabalho missionário em que Jesus Cristo enviou os Apóstolos – dois a dois – para pregar, curar, visitar, e rezar, desejando Paz às pessoas.
Excelência Notícias – Ao passo que o senhor invoca o fortalecimento da religiosidade como uma das premissas básicas de quem visita anualmente o Santuário do Muquém, anos atrás foi superada uma antiga polêmica que era a presença da ‘Barraca Niquelândia’ na área comercial da Romaria, que retirou-se desse local e foi para o Povoado do Muquém por determinação do então bispo, Dom Messias dos Reis Silveira. Porém, sabemos que boa parte das pessoas que vão ao Muquém sequer entram no Santuário. Como a Igreja Católica, na pessoa do senhor, lida com essa mistura do Sagrado com o Profano na Romaria?
Padre Aldemir – Essa é uma pergunta bastante interessante, sobre o sagrado e o profano. Porém, a porta principal do Santuário (ao término das escadarias e rampas de acesso) é o divisor efetivo entre esses dois mundos. Quem está no profano, ao passar por essa porta, deixa esse ‘mundo velho’ e adentra ao ‘mundo novo’, que é o Espaço Sagrado. Toda a área do Santuário é sagrada. Existem muitos espaços sagrados pela instituição (a Igreja Católica) e pelos romeiros. Por exemplo, quando o romeiro entra pelo portão principal, ele está entrando na ‘Terra da Santa’ (Nossa Senhora da Abadia), atribuindo àquele espaço ao Sagrado, que não é para se fazer bagunça, vandalismo, enfim. Depois, do lado, existe uma bandeirinha onde o romeiro coloca um raminho – um símbolo sagrado, uma representação – pedindo permissão para entrar na ‘Terra da Santa’. Existe também o veleiro, ou Cruzeiro, onde se acendem as velas com pedidos às almas das pessoas que já faleceram, defronte à Igreja. Dentro do ‘edifício’ (o prédio da igreja, no caso) também existem vários espaços sagrados como a Capela do Batismo; a Capela do Santíssimo; o Presbitério; e o altar de Nossa Senhora. Nos montes, também temos representações simbólicas dos espaços sagrados, como o Monte da Cruz, onde tem a imagem de Jesus Cristo; e o Monte do Cruzeiro, onde os romeiros colocam os objetos alusivos às graças e votos que alcançaram, que receberam.
Excelência Notícias – Acima, falamos há pouco sobre os avanços da comunicação na era moderna. Dessa forma, com o advento de aplicativos de mensagens como WhatsApp, tornaram-se cada vez mais frequentes os questionamentos polêmicos em grupos sobre a arrecadação da Igreja Católica nos dez dias da Romaria do Muquém, em função do enorme fluxo de pessoas que passam pelo Santuário todos os anos. Afinal de contas, o Muquém arrecada quanto em recursos, sob a responsabilidade do senhor, enquanto reitor do Santuário? Qual é a destinação desse dinheiro, efetivamente?
Padre Aldemir – Os devotos de Nossa Senhora da Abadia e as demais pessoas, evidentemente, têm o direito de querer saber essa informação, de ter essa curiosidade. Isso não é mais segredo: a arrecadação da Romaria do Muquém é de cerca de R$ 1,2 milhão anualmente. Desse valor, gastamos 48% (R$ 576.000,00 aproximadamente) com as despesas necessárias ao bom funcionamento da romaria, propriamente dita. Dos 52% restantes (R$ 624.000,00, em valores aproximados) dessa arrecadação, 60% (R$ 374.400,00 aproximadamente) ficam para o próprio Santuário do Muquém; e os 40% dessa subdivisão (cerca de R$ 249.600,00) são encaminhados à Diocese de Uruaçu para ajudá-la em sua obra de evangelização, o que inclui a manutenção dos 25 seminaristas no Seminário Maior São José ao custo de R$ 2.500,00 por cada um, por mês, dentre outras necessidades da própria diocese. Como eu já disse, não há mais segredo. Até então, chegou aos meus ouvidos que o pessoal (o público em geral, em comentários que circularam em Niquelândia e região) havia dito que saíram cinco carros fortes, daquela empresa Brinks, com dinheiro do Muquém. Se isso fosse verdade, seria bom demais. Então, a grandiosidade da Romaria favorece esse imaginário popular que o Muquém é uma mina de ouro para a Igreja Católica. A Romaria, nesses 10 dias, transforma o Santuário numa outra cidade, dentro de Niquelândia. E, como qualquer cidade, a Enel tem seus custos, a Saneago tem seus custos; a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros têm seus custos (banco de horas para garantia de mais efetivo do Estado na romaria, por exemplo); bem como a Ação Social do Governo de Goiás que vai colocar uma tenda (da Organização das Voluntárias de Goiás/OVG) no trevo do Muquém/Colinas do Sul, que também tem custos para o Santuário. Todos os parceiros tem custos. Inclusive o próprio Santuário, que possui cerca de 400 pessoas trabalhando na Romaria. E nós, do Santuário, temos de pagar as diárias; fornecer alimentação; fazer o transporte; e até mesmo acomodar boa parte dessas pessoas, por nossa conta. Então, para tudo isso, existe um custo.
Excelência Notícias – Há dez anos, quando entrevistei o senhor pela primeira vez, falava-se numa frequência de público em torno de 150 mil a 200 mil pessoas nos 10 dias da Romaria do Muquém, aqui em Niquelândia. Atualmente, sua estimativa é de que 400 mil pessoas passem pelo Santuário nesse período. Quais são os motivos para esse crescimento ter dobrado após uma década?
Padre Aldemir – Em 2017, a Polícia Militar do Estado de Goiás fez uma estatística, através de um cálculo matemático, que estimou esse público do Muquém em 400 mil pessoas. Então, vejo que a Romaria está um franco processo de ascendência, crescendo a cada ano. Primeiramente, pelas melhorias na qualidade do espaço e do ambiente do Santuário. Em segundo lugar, pela espiritualidade que é oferecida aos romeiros; em terceiro lugar, porque trata-se de uma ‘festa boa’; e em quarto lugar porque as pessoas que vivem nas ‘sociedades modernas’ – onde se oferecem variados tipos de diversão e de lazer – experimentam internamente um grande vazio espiritual, que é provocado pelo consumismo. E, quando essas mesmas pessoas visitam a Romaria do Muquém, elas encontram uma oferta, que é a oferta religiosa. E essa oferta enche o coração das pessoas na graça, no fortalecimento da espiritualidade. A Romaria, então, constrói a vida da pessoa. Essa é a principal função social da Romaria do Muquém. [Euclides Oliveira]