À espera da liberdade, mulher de 37 anos conquista reconhecimento paterno pelo “Programa Pai Presente”, do Judiciário
Em 1981, familiares de Tereza Cristina Moreira dos Santos culparam seu pai, Valdecy Vicente Coelho, pela morte da esposa durante o parto, e o afastaram da filha, quando ela era pequena. Atualmente presa em Niquelândia, Tereza já mantinha contato com o pai, mas ainda faltava a formalização da paternidade, procedimento agilizado pelo juiz Rodrigo Victor Foureaux Soares, que endossa iniciativa do TJ-GO
De malas prontas para assumir a titularidade da Comarca de Cavalcante em fevereiro após o recesso forense, o juiz-substituto da 2ª Vara Cível de Niquelândia, Rodrigo Victor Foureaux Soares, recebeu a reportagem do Portal Excelência Notícias em seu gabinete na tarde da terça-feira (18) para um balanço das atividades do “Programa Pai Presente” na cidade do Norte do Estado em 2018.
Regulamentada pela Corregedoria Geral de Justiça de Goiás (CGJ-GO) no segundo semestre de 2010 e avalizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no início de 2012, a iniciativa já oficializou mais de 14 mil reconhecimentos de paternidade em todas as comarcas do Estado, em pouco mais de seis anos.
Em Niquelândia, somente entre maio e setembro deste ano, o magistrado contabilizou 15 reconhecimentos de paternidade bem-sucedidos a partir do “Programa Pai Presente”, com o objetivo de que a formalização não se dê apenas na certidão de nascimento – a partir do seu despacho como juiz – como medida jurídica posterior aos exames comprovatórios de carga genética (DNA).
Nos casos que for possível, Rodrigo Foureaux entende que o programa pode contribuir para o estabelecimento ou restituição dos vínculos afetivos entre pais e filhos. Segundo o juiz, o perfil dos pais que respondem processos nesse sentido, normalmente, atestam que eles não possuem boa estrutura familiar.
Daí a importância de amenizar a distância entre pais e filhos, segundo ele, principalmente nos casos em que houve divergências familiares após o nascimento e/ou na fase de crescimento de uma criança.
Um dos casos mais emblemáticos com esse perfil – resolvidos pelo “Pai Presente” na Comarca de Niquelândia pelo juiz Rodrigo Foureaux – envolveu o lavrador aposentado Valdecy Vicente Coelho, de 65 anos, morador em Colinas do Sul; e sua filha Tereza Cristina Moreira dos Santos, de 37 anos, atualmente recolhida na Unidade Prisional de Niquelândia (UPN) no Bairro Santa Efigênia.
Por todo esse tempo – desde que o então bebezinho do sexo feminino nasceu, em 1981 – familiares da mulher com quem o lavrador era casado na época o impediram de visitar a criança.
A alegação era muito forte: Valdecy teria sido o culpado pela então esposa ter morrido por ter sofrido uma hemorragia interna na mesa de cirurgia, durante o parto de Tereza.
Por conta disso, a tia de Tereza registrou a menina somente com o nome da mãe e dos avós maternos, que criaram a menina. Apenas com 9 anos – depois de quase uma década tendo o avô como referencial de “pai” – é que Tereza soube que Valdecy era seu pai verdadeiro.
Ainda assim, com referências pouco positivas dele, porque a família da mãe de Tereza realmente não gostava de Valdecy. Embora bem tratada pelo avô que fez às vezes de pai, Tereza sentia-se rejeitada por não ter o nome do pai na certidão de nascimento.
Porém, depois de muito tempo separados, Tereza pôde ter maior convívio com o lavrador e conseguiu perceber que Valdecy era um pai muito atencioso e carinhoso.
Depois disso, Tereza já recebeu a visita do pai e de seus três filhos (crianças que Valdecy agora pode chamar de seus netos, diga-se de passagem) na cadeia da cidade do Norte do Estado e, agora, espera ansiosamente por sua liberdade para recuperar o tempo perdido, sem desgrudar do pai.
RESGATE DO AMOR – “Ela (Tereza) teve um sentimento de verdadeira gratidão por essas facilidades que o Poder Judiciário ofertou para que o nome do pai (Valdecy) pudesse constar no registro de nascimento dela, por meio do Programa Pai Presente. Mas, muito mais do que fazer constar o nome do pai nos documentos dela, nosso objetivo é sempre resgatar a relação de amor que deve existir entre um pai e um filho”, afirmou o juiz Rodrigo Foureaux, na entrevista exclusiva ao Portal Excelência Notícias.
Mãe de dois adolescentes e de um menino de cinco anos, Tereza estava muito feliz na última semana no Fórum de Niquelândia quando ela e Valdecy assinaram, diante do juiz Rodrigo Foureaux, a papelada necessária para que fossem legalmente considerados como pai e filha, através do Programa Pai Presente.
Na oportunidade, o magistrado estava ladeado pela servidora do fórum Nájila Aidar, que administra o programa de reconhecimento paterno em Niquelândia. Ela acompanhou de perto as tratativas entre Tereza e Valdecy, feitas pelo Judiciário.
Porém, se o caso em específico desta reportagem teve um final cujo anseio de pai e filha era o mesmo, nem sempre os reconhecimentos de paternidade são assim tão fáceis. Para casos assim, segundo o magistrado, o “Programa Pai Presente” fornece tal auxílio de maneira extrajudicial.
Na presença da mãe e da própria criança para a qual se deseja a obtenção de reconhecimento do pretenso pai com quem a mulher relacionou no passado, explicou o juiz, o Fórum de Niquelândia fornece um documento para ser preenchido na hora, conhecido como “Termo de Indicação de Paternidade”.
De posse das informações fornecidas por mãe/filho(a) do suposto paradeiro do pai da criança, o Poder Judiciário de Niquelândia toma todas as providências necessárias para que o homem seja intimado para comparecer ao Fórum.
No primeiro momento, de acordo com o juiz, tenta-se que o problema da indefinição paterna possa ser resolvido de forma consensual pelos genitores.
SEM LITÍGIO, EM APENAS 60 DIAS – “Se o pai reconhecer a paternidade – voluntariamente, com ou sem exame de DNA – o trâmite é mais rápido e encaminhado por nós para o Cartório de Registro Civil para ser feito esse reconhecimento, num prazo de até 60 dias. Num processo judicial tradicional, existe todo aquele litígio e o calor das emoções acerca de fatos do passado, que empurram a resolução do reconhecimento de paternidade por meses ou anos. Por isso é que nós (do Judiciário) através do ‘Programa Pai Presente’, sempre que possível, procuramos privilegiar a resolução de forma extrajudicial. No acordo, na conversa, todos sempre vão sair ganhando”, completou o magistrado.
O juiz também detalhou que, em todo o Estado, a CGJ-GO realiza mutirões com frequência nas comarcas para que processos de reconhecimento de paternidade possam ter desfecho favorável, através do “Programa Pai Presente”.
Para Rodrigo Foureaux, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) está bem à frente no trato dessa delicada temática no País em relação aos outros Estados justamente por seu pioneirismo na implantação do “Pai Presente”, pelo fato do reconhecimento paterno ser um direito legal e constitucional previsto no parágrafo 7 do Artigo 226 da Carta Magna de 1988.
A DESPEDIDA DE NIQUELÂNDIA – “A carreira anda. Então, a minha saída da Comarca de Niquelândia se dá em razão de uma promoção para a entrância intermediária que, no meu caso, será a Comarca de Cavalcante, conforme decisão da Corte Especial do TJ no último dia 10. Meu sentimento é de muita gratidão pela Comarca; de muito aprendizado nesse tempo todo que estive aqui, por cerca de um ano e seis meses. Pude tratar de casos interessantes; e conhecer pessoas fantásticas. Por isso, jamais vou esquecer essa minha passagem como juiz aqui em Niquelândia, na minha carreira; e deixo registrado aqui meu agradecimento aos advogados; a população; ao Ministério Público; e aos servidores aqui do Fórum”, agradeceu o juiz Rodrigo Foureaux, ao término da entrevista (com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-GO)